Velho do Farol

Porque sim.

Velho do Farol

22 de junho de 2004

Arte efêmera

Eu não podia ficar indiferente a isso. A incrível reportagem fotográfica da revista Época dessa semana é de deixar qualquer um de queixo caído.

Apesar do entusiasmo do público especializado, gente normal como eu e você não chega a levantar sobrancelhas para as últimas novidades reciclagens do mundo da moda. Mas o desfile de Jum Nakao na São Paulo Fashion Week foi uma surpresa sem precedentes.

O estilista paulistano usou papel vegetal cortado a laser para criar vestidos que parecem saídos de um sonho, inspirados no glamour de várias épocas e locais. Aliou a força do branco puro com uma caracterização impecável de suas modelos usando collants pretos e capacetes de bonecos Playmobil (quem já teve um brinquedo desses quando criança não tem como não se arrepiar com o resultado).

Nota-se que autor não se limitou a mimetizar vestidos "reais", mas adaptou-os para formas geométricas extravagantes e delicadamente irreais.

Isso pra mim não é só moda: é arte em toda a sua nobreza. Grande arte sim, mas com prazo de validade marcado pelo próprio artista: ao final do desfile, as roupas foram rasgadas em plena passarela, causando grande comoção na platéia, que urrava e se descabelava com o espetáculo. As próprias modelos já tinham chorado nos bastidores, ao serem informadas que deveriam destruir as peças.

Nakao (que tem formação de artes plásticas) justificou lindamente: "Eu queria levar emoção, fazer as pessoas pensar, entender que a moda é algo efêmero. Mas também falar do desejo por meio de peças refinadas e da inevitabilidade da perda, que culminou com as roupas rasgadas".

Evidentemente nenhuma das peças expostas será reproduzida para venda. O processo de criação da coleção e o próprio desfile foram registrados e comporão um DVD. As fotos são de Paulo Giandalia. Mais fotos no site da ABIT. O desfile foi notícia em alguns sites estrangeiros.

Depois de tanta arte conceitual sem noção nem emoção, de artistas que apenas expõem conceitos e não tocam o coração nem embelezam o mundo, coisas como essa ainda me fazem ter fé em algum tipo qualquer de vanguarda - palavra que já pareceu tão instigante e hoje é quase palavrão.

por Marcus Pessoa, às 00:32 -

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