Velho do Farol

Porque sim.

Velho do Farol

28 de outubro de 2006

O debate da Globo


Quando a TV Globo anunciou o formato de seu debate entre os candidatos a presidência, aparentemente idêntico ao de 2002 entre Lula e José Serra, eu imaginei que ele pouco influiria nos rumos da eleição.

Continuo achando, e também que a vitória de Lula amanhã está selada. Não houve vencedor ontem, e nem poderia haver. Esse formato de perguntas e respostas curtas sobre temas gerais permite apenas que cada um diga o que quer, sem ser efetivamente questionado.

Alckmin mentiu descaradamente pelo menos uma vez, ao criticar o projeto de gestão de florestas, segundo ele uma "privatização" das terras públicas. Não só o PSDB votou a favor do projeto, como este foi apoiado igualmente por madeireiros e ambientalistas. Acusar Lula de privatista é um gesto de desespero que me deixa até constrangido.

De qualquer forma, o debate não foi idêntico ao de 2002. Caso alguém não tenha notado, no debate de quatro anos atrás as perguntas eram neutras, não havia os "dramas pessoais" expostos em todas as perguntas do debate de ontem. Era um com a casa alagada, outro com os amigos assassinados, etc. Um chororô unânime, que certamente foi insuflado (roteirizado?) pela equipe da TV.

Um dos eleitores "indecisos", inclusive, foi questionado em seu livro de recados no Orkut, por seus próprios amigos, sobre essa história da carochinha de que tem que pegar três ônibus para chegar à faculdade.

por Marcus Pessoa, às 02:49 -

26 de outubro de 2006

Firefox 2.0

Firefox 2A Mozilla Corporation lançou anteontem a versão 2.0 do Firefox, o melhor navegador da internet. Se você usa o Internet Explorer e não conhece esta alternativa, saiba por que ele é um programa moderno, confiável e com muitos recursos.

O Firefox 2.0 é recomendável a todos. Está mais leve, mais rápido, e diminuiu o consumo de memória (reclamação freqüente entre seus usuários). Tem muitas novidades, principalmente no gerenciamento de abas, de feeds RSS, e no campo de busca. Possui agora avisos contra sites fraudulentos (phishing) e gerenciamento de sessões. Guias ilustrados sobre as novidades podem ser encontrados aqui e aqui.

Uma das principais novidades é a correção ortográfica, mas, para que ela funcione, é preciso primeiro instalar o dicionário em português brasileiro.

Dois dos artigos mais elogiados deste blog foram este, sobre o lançamento da versão 1.0 do Firefox, e este, falando um pouco da minha descoberta pessoal da internet e do Netscape, primeiro navegador que utilizei e que inspira o Firefox até hoje.

Para tirar dúvidas ou debater sobre o programa, uma opção é a comunidade oficial no Orkut, Firefox Brasil, da qual sou moderador, e que tem um pessoal muito bom participando.

por Marcus Pessoa, às 20:19 -

18 de outubro de 2006

Indústria do disco processa brasileiros

O texto abaixo é de meu amigo Bennett, editor do fórum Joio:

Era questão de tempo. A IFPI anunciou ontem que irá começar a processar usuários de redes p2p também no Brasil. Estão tocando 8000 legal actions (categoria um tanto ampla) ao redor do mundo, envolvendo 17 países. (...)

Em território nacional, quem irá cuidar dos processos será a ABPD, que em entrevista coletiva mencionou, além de alguns dados numéricos altamente questionáveis, a intenção de processar vinte usuários de redes de compartilhamento. Todos, supostamente, em dado momento disponibilizaram para upload algo entre 3000 e 5000 músicas. A ABPD não parece estar interessada em quem tem disponibilizado um punhado de discos apenas.

Não se sabe muito bem, até agora, o que de fato ocorrerá, ou mesmo qual a estratégia jurídica da ABPD. O fato de que o CTS (Centro de Tecnologia e Sociedade) da FGV-RJ, apesar de previamente inscrito, foi barrado da coletiva da ABPD, sinaliza que a intenção é espalhar desinformação sobre quais ações serão tomadas. Ao que tudo indica, o objetivo da ABPD é, ao mesmo tempo, testar qual vai ser a resposta do Judiciário para os casos, e intimidar usuários de diversas redes. Shock and awe.

A imprensa nacional, em questões de propriedade intelectual, costuma repetir press releases sem o menor pudor e senso crítico. Uma parte que enxerga a situação por um outro ângulo é então impedida de participar da coletiva, por motivos óbvios. Quanto mais desinformação é espalhada, melhor para a indústria fonográfica. (...)

A questão de que redes teriam sido afetadas está longe de ser a única que se encontra nebulosa. A ABPD/IFPI diz não ter identificado os usuários, de modo que, teoricamente, eles só disporiam, no momento, de alguns números IP. Mas segundo me disse em correspondência pessoal Bruno Magrani, do CTS/FGV-RJ, a intenção parece ser processar civil e não criminalmente, e existe a possibilidade de que a ABPD já se encontre com os nomes dos usuários vinculados a cada IP.

Se de fato a ABPD já se encontra na posse destes nomes, há problemas sérios em relação ao fornecimento deles pelos provedores de acesso, sem ordem judicial. (...)

O CTS está com uma proposta de alteração do art. 46 da Lei de Direitos Autorais (...) Há uma petição online para apoiar essa alteração. Enquanto as coisas continuam imprevisíveis, não disponibilizem mais de 3000 arquivos em qualquer rede de compartilhamento. (...) Caso algum problema surgir, o CTS está estudando a possibilidade de, se não representar diretamente os réus, pelo menos oferecer algum tipo de assessoria jurídica. (...)

Interessante mencionar que esta ação da IFPI vem, curiosamente, na esteira de uma mega-operação anti-pirataria chamada I-Commerce. (...) Juntando um grupo de ações a outras totalmente diferentes -- umas contra piratas de verdade, outras contra usuários de redes p2p -- prossegue a associação da pirataria ao compartilhamento de arquivos, algo longe de ser coerente, mas que a imprensa segue perpetuando.

Não parece ter sido coincidência que a operação I-Commerce e o anúncio da IFPI tenham ocorrido em sucessão imediata. Sob o rótulo odioso da pirataria, é mais fácil atacar na mídia -- e em juízo, se o juiz for desinformado -- milhares de usuários de redes de compartilhamento. Estratégia de propaganda básica, mas eficaz.

Os efeitos, para o futuro: nulos, se estivermos considerando o impacto na proliferação de redes. Alguns compartilhadores serão processados e talvez condenados, ouviremos muita bravata da indústria do conteúdo, o compartilhamento quem sabe seja ainda mais estigmatizado pela imprensa, mas de resto, tudo continuará como antes. Não há mais volta.

(texto completo aqui)

por Marcus Pessoa, às 23:10 -

16 de outubro de 2006

Sobre a imprensa vendida

Manchete desonesta de O Globo

[atualizado] Eu já achei O Globo um bom jornal. Continua sendo, aliás, mas em época de eleição tem gente pirando na batatinha. Vale tudo pra tentar eleger Geraldo Alckmin.

A notícia destacada na capa de hoje do jornal é a seguinte: Tasso Jereissati, presidente do PSDB, pediu à OAB e ao Congresso Nacional que "intervenham" na investigação da Polícia Federal sobre o dossiê. O PT reagiu dizendo que vai explorar a "complacência com o crime" da polícia de São Paulo.

O que é apenas um confronto entre as máquinas de spinning dos dois partidos tornou-se algo bem diferente no título desonesto e capcioso do Globo. "PT usará facção do crime para abafar dossiê" dá a entender que o partido usará os serviços do PCC para abafar a investigação. Não só isso não é verdade, como o Globo ainda não conseguiu mostrar ao distinto público qualquer indício de que a investigação está sendo abafada.

E teve gente, no post anterior, tentando negar que a grande imprensa está em campanha pelo tucano. Fazem-me rir.

PS: vazou hoje a gravação da conversa constrangedora entre o delegado tucano Edmilson Bruno e os jornalistas que receberam as fotos do dinheiro do dossiê. Parece uma conversa de mafiosos negociando muamba: combinam uma mentira coletiva e discutem providências para que a polícia não descubra a tramóia.

por Marcus Pessoa, às 21:02 -

15 de outubro de 2006

Eram os deuses depredadores?


A pergunta se justifica quando tomamos contato com o que aconteceu de verdade na Ilha da Páscoa, uma das mais intrigantes histórias sobre a passagem do homem pela Terra.

Essa ilha, pequeno pedaço de terra literalmente no meio do nada (Oceano Pacífico, a 2000 km da civilização mais próxima), é famosa mundialmente pelos moai, enormes estátuas de pedra que a adornam.

São tão grandes e pesadas que durante muito tempo perguntou-se como aquele povo primitivo encontrado pelos europeus há séculos atrás poderia tê-las construído e transportado para seus locais atuais. O livro de Erich Von Daniken, Eram os Deus Astronautas?, fez um enorme sucesso há algum tempo especulando que estas e outras maravilhas do mundo antigo teriam sido presente dos "deuses", na verdade seres de uma avançada civilização extraterrestre.

Hoje se considera perfeitamente razoável que foram mesmo os nativos que construíram as estátuas, já que elas são feitas de rocha vulcânica relativamente mole, que pode ser esculpida facilmente. Experiências recentes reconstituíram, usando apenas material que existe na ilha, o que poderiam ter sido as operações para movimentar os enormes blocos.

O povo que levantou as estátuas era desenvolvido, mas quando os europeus chegaram à ilha, encontraram apenas um punhado de nativos vivendo em cavernas. E sabem por quê? Porque eles tinham involuído como civilização após esgotarem seus recursos naturais.

A ilha, hoje quase inteiramente desmatada, era coberta por florestas na época em que os polinésios a ocuparam, há quase dois mil anos. A madeira era a base da sociedade, e usada nas casas e nos barcos e redes de pesca. Com o exaurimento das florestas, tornou-se impossível pescar e a sociedade entrou em colapso: escassez de alimentos, guerras e até canibalismo. Sem barcos apropriados, os habitantes da ilha ficaram presos a ela e definharam.

Que isso sirva de lição pra nós, que estamos numa Ilha da Páscoa em escala ampliada: o nosso pequeno planeta Terra. Não temos para onde ir, e estamos acelerando a depredação dos recursos naturais que nos mantêm vivos.

Em que cavernas vamos nos esconder, eu não sei. Mas vão ser poucos que conseguirão, e no caminho pra elas veremos uma versão ligeiramente mais selvagem da luta de classes estudada por um certo barbudo alemão.

por Marcus Pessoa, às 06:33 -

11 de outubro de 2006

Turistas


Os gringos que se cuidem. O Brasil não tá pra brincadeira não. Já mostrou no caso do Legacy, quando puniu as manobrinhas inocentes de dois pilotos com o castigo de enfrentarem os péssimos serviços dos hotéis cinco estrelas daqui.

E o que dizer daqueles que vêm aqui só pra beber, fornicar, fazer topless na praia, entrar em contato com a manemolência e a sensualidade dessa gente morena, nesse lugar abaixo do equador onde o pecado não existe? Podem até achar que fizeram um bom negócio, mas não perdem por esperar.

Turistas, assim mesmo, em português, é um filme de terror com lançamento previsto nos EUA para 1º de dezembro. Mostra a aventura de uma turma de pobres gringos sofrendo um Boa Noite Cinderela bacana dos brazucas malvados e ganhando aquilo que a Maria ganhou na capoeira.

O trailer está disponível numa bonita página imitando um perfil verdadeiro no Myspace. É tipo O Albergue em clima tropical, ou seja, gente sendo torturada em detalhes, para o deleite de nerds punheteiros. E não devem faltar todos os elementos tão característicos de nossa cultura. Tem até o índio mau.

por Marcus Pessoa, às 18:03 -

8 de outubro de 2006

A imprensa tucanou

Veja - AlckminÉpoca - AlckminIstoÉ - Vôo 1907

As capas acima falam por si. Se alguém ainda tinha dúvida de que a grande imprensa está em campanha por Geraldo Alckmin, não tem mais. Os grupos Abril e Globo jogam a notícia mais importante da semana para o miolo, e dão destaque a matérias laudatórias ao candidato do PSDB, travestidas de "jornalismo isento".

A Veja é reincidente em brigar com a notícia por interesses eleitoreiros. Em maio, quando o país ficou estarrecido com os ataques do PCC, o semanário só destacou o assunto no Rio e em São Paulo, mandando para o resto do país uma capa com uma matéria sem importância sobre saúde. Afinal, pegava mal para o Chuchu ter o seu fracasso na área de segurança estampado de norte a sul do país.

Debate na Band

Não vou aqui avaliar o debate. Quero apenas dizer que estou profundamente indignado com o fato dos jornalistas da Band, todos, terem trabalhado em favor de Alckmin.

As duas perguntas contra Lula: uma, repisando a propaganda do PSDB sobre se Lula "sabia" da corrupção; outra, falando em "crise moral", no fato dos "vilões de novela se darem bem", dizendo sutilmente que Lula se beneficia da leniência dos eleitores com a corrupção.

As duas perguntas levantando a bola para Alckmin: uma, citando o caso de Champinha e permitindo a Alckmin falar de suas propostas de endurecimento das leis penais; a outra, praticamente copiando o discurso do Chuchu a respeito de corte de gastos e queda dos juros.

E ainda querem posar de defensores da democracia. Tenham a santa paciência. Golpistas, isso é que são.

por Marcus Pessoa, às 23:35 -

6 de outubro de 2006

O lírio mimoso


Não esperem concisão ou coerência. Não estou falando de coisas à toa, classificáveis, mas de fragmentos do caos original. De sensações, acontecimentos, pessoas, imagens, lembranças, tudo misturado.

Domingo é o Círio de Nazaré. E acredite, se você não mora em Belém, ou não veio aqui pra sentir na real, ou ficou só na sacada do hotel vendo as pessoas passarem, você não sabe de nada.

Antes o Jornal Nacional falava da "maior festa religiosa do norte". Agora não dizem mais o que é. Não sabem, ou não querem admitir. Que essa é a maior festa religiosa do mundo. Fora Ramadã em Meca e coisa e tal. Mas ela se passa nesse enclave em plena selva. Esse lugar que ninguém entende. Nem nós, que moramos aqui.

A gente não chama Nossa Senhora de Nazaré. A gente chama de Nazaré. Ou Naza. Ou Nazica, até. A gente trata como uma tia querida, ou como a mãe mesmo, se a de verdade morreu. Foi achada no rio, você acredita? Mais uma das historinhas de santas caídas no rio, achadas por pescadores. O enredo é o mesmo. Ela voltava sempre. Sei lá, aqui é calor, vai ver ela queria se refrescar.

Belém não é Belém, é Santa Maria de Belém do Grão Pará. E o Vicente Cecim encurta, põe Santa Maria do Grão. Num lugar mítico que não chama Amazônia, chama Andara. Eles têm o Grande Sertão, nós temos Andara. Um lugar onde você se perde e nunca mais é encontrado. Onde você deixa sua alma passear, e ela foge de você, e você nem percebe.

Tem água do rio em nossas veias. A gente não acredita em tanta água. Não é o mar. É um mar correndo no meio da nossa vida. É a selva tragando coisas e pessoas. Vocês tiveram a prova um dia desses.

Rewind. O Valerius Ensemble toca duas peças difíceis de Schubert. Ninguém gosta muito, só eu e uns poucos. As palmas não são entusiasmadas. Mas todo mundo se acha europeu. O teatro é europeu. O art noveau do hall é europeu. O neoclássico da fachada é europeu também. Mas a gente sai, e a praça tá cheia de gente acampada no Grito da Terra. Esse pessoal grita e tem razão. E o enclave grita junto com eles. Pois a gente é europeu sim, mas a gente também foi largado no meio do nada pelos canalhas. A Transa Amazônica é um cemitério compriiido.

E a Naza galvaniza essas pessoas tão diferentes, interrompe a luta de classes durante duas semanas. O catolicismo é pelego mesmo, mas quem se importa? Santos são uma coisa legal. O povinho não acredita direito que Deus olha pra cada um eles. Não se acha tão importante assim. Pede ajuda aos embaixadores. Jorge era um soldado, Benedito um cozinheiro, Naza uma menina pobre. O povinho acha que eles vão entender. E pede pra eles. E quando eles estão pedindo pra Naza, todos juntos, dá um nó na garganta. E esse nó nunca vai desatar.

Vocês não sabem. Não é a pequena cidade tragada pelo turbilhão. Não é a grande cidade apenas tendo algo sobre o que falar naquele dia. É a grande cidade sumindo, não dando pra ver o chão, é gente gente gente. Não precisa ser católico, não precisa acreditar em Deus. Mesmo os crentes vão lá, escondidos do pastor. A Naza é boa e não pergunta.

Hoje e amanhã são os melhores dias. Todo mundo sai pra ver a noite, pobre, rico, brega, cult. Famílias andam a pé, tem um monte de coisa pra ver. Tem os brinquedos de miriti, tem o arraial, tem os fogos, tem mil procissões que fazem a santa ir pra lá e pra cá. Ninguém tem medo da morte, de assalto, de acidente, a Naza cancela essas coisas durante alguns dias. Liberta o povo que vive preso em sua própria casa. As ruas voltam a ser de propriedade das pessoas e não das coisas.

Muito antes de Paradas Gay já tinha a Festa da Chiquita Bacana. O Bar do Parque nunca fecha, a não ser pra saudar a Naza. E antes de fechar os viados dão a maior festa. A Naza liberta eles também. E na festa vai todo mundo, homem, mulher, viado, sapatão. Tem carimbó e tal, não é macumba pra turista, o pessoal gosta mesmo. E tem o Viado de Ouro, o oscar da bichice. Que é entregue pra um viado com relevantes serviços prestados. O Edmilson Rodrigues, quando era prefeito, entregou o prêmio pessoalmente. Filho de pastor protestante, não fez mediazinha babaca, mas um discurso apaixonado em defesa dos viados.

A Chiquita é legal porque todo mundo vai. Tá encalacrado com trabalho, tá deprê, nunca mais saiu nem encontrou os amigos de verdade? Não esquenta, vai na Chiquita que encontra. É só ir lá do lado, na escadaria do teatro, tá todo mundo lá. No dia em que o Paulo Chaves quis interditar, foi motim. Ninguém aceita burguês elitista dando ordens no povo.

Hoje é sexta, tem Auto do Círio, tem samba junto com reza, e não são coisas diferentes. A gente faz o religare por nossa conta, somos gregos também, dóricas são as colunas da Praça da República, pagã e cristã sem neuras a nossa fé. O auto é daqui a pouco e eu não vou ficar mais escrevendo na internet. Vou ser feliz e já volto. Que a Naza abençoe a todos nós.

por Marcus Pessoa, às 15:26 -

5 de outubro de 2006

Self made writers

O Alex Castro fez uma interessante reflexão sobre sua experiência recente, quando colocou à venda cópias eletrônicas de seu livro de contos, Onde Perdemos Tudo. Estou lendo e fiquei bem impressionado com o primeiro deles, "A morte do meu cachorro". Assim que terminar o livro e tiver tempo, escreverei uma resenha aqui. Para comprar, visite o site do Alex.

Ele arrecadou até o momento cerca de 30 dólares, e comentou:

Para termos de comparação de valor, US$ 30 é quanto eu pago pelo meu plano de celular. Ou seja, dez anos dos meus melhores esforços literários valem, de acordo com o sistema de valores capitalistas, a mesma coisa que o mais vagabundo plano de celular, que mal dá direito a falar meia hora por mês.

Ele deixa claro, mais embaixo, que não está reclamando, mas apenas comparando com o tempo em que dava aulas de inglês a R$ 15 a hora, que demandam bem menos tempo e esforço intelectual do que escrever e reescrever um bom livro como o dele.

Talvez seja estranho, mais foi exatamente o fato dele estar vendendo, e não dando as cópias do livro, que atiçou meu interesse em adquiri-lo. O que mais tem por aí são escritores oferecendo livros de graça pela internet, tentando chegar a um público maior. Acho até que o próprio "Onde Perdemos Tudo" chegou a ser oferecido nesse esquema, e eu não dei bola na época. Quando o escritor, ao invés de dar, pede um pequeno preço pelo livro, fico com a impressão de que "confia no seu taco", e que o trabalho deve ter valor.

E isso não quer dizer, é claro, que os livros que estão sendo oferecidos de graça não sejam bons. Sexo Anal, romance de estréia do Luiz Biajoni, é excelente, e também pretendo escrever uma resenha sobre ele em breve. Aguardem.

por Marcus Pessoa, às 10:16 -

2 de outubro de 2006

Sobre a eleição

Primeiro, quero dizer que estou feliz pelo fato da senadora Ana Júlia (foto) ter ido para o segundo turno aqui no Pará contra o ex-governador Almir Gabriel. É a possibilidade concreta de desalojar a corja tucana que está no poder há 12 anos.

Nesse período, houve o massacre de Eldorado de Carajás, a privatização da companhia elétrica estadual (que fez triplicar as contas de luz), um cabuloso escândalo de corrupção (isenções para cervejarias) envolvendo diretamente o governador e o ex-governador, e o aumento dos casos de trabalho escravo e de mortes em conflitos agrários. O Pará tem os impostos mais altos do país, as riquezas naturais continuam sendo retiradas daqui sem qualquer contrapartida, e há um descalabro na situação da saúde e segurança pública. A compra de votos é prática corriqueira no interior, e os sucessivos governos do PSDB têm deixado à míngua as cidades cujos prefeitos são de partidos da oposição.

No campo nacional, já era esperada a não-vitória de Lula no primeiro turno, graças a Berzoini e seu Personal Denunciator Tabajara. E acho que o pessoal de esquerda está exagerando, está uma sangria desatada por causa disso. Entre os leitores da Mary está um chororô. Nas discussões de ontem do Botequim Socialista a certeza de uma vitória de Alckmin parecia maior do que na própria comunidade deste no Orkut. Começou imediatamente uma troca de acusações com os integrantes do PSTU e PSOL, que foram chamados de "quinta coluna" pra baixo. É aquele ditado, em casa que tem pouco pão, todo mundo briga e ninguém tem razão.

Muita calma nessa hora. As pessoas esquecem que o voto em Lula está muito consolidado, e que ele deixou de ganhar no primeiro turno por menos de um ponto e meio percentual. O jogo está aberto. Alckmin tem a vantagem psicológica, mas a batalha está longe de já ter um vencedor.

Minha conversa é com os eleitores progressistas. O post anterior, aliás, não foi dirigido aos que votam em Alckmin. Tem gente que vem contestar usando argumentos de duas linhas, e que fazem questão de não analisar o todo da questão. Não é o caso da LOka, por exemplo, que fez um longo arrazoado para declarar voto no Chuchu -- do qual discordo inteiramente, mas não posso dizer que não é uma decisão pensada. Mas ela é exceção, a maioria dos argumentos pró-Chuchu que eu leio são de uma pobreza incrível. É o tal que acha que os nordestinos não têm discernimento suficiente para escolher. É o outro que realmente acredita que no PSDB não tem corrupção. Com essas pessoas não há diálogo possível.

Eu quero me dirigir a você, meu leitor e/ou amigo, que votou em Heloísa Helena, ou Cristovam, ou nulo, e pretende votar nulo agora. Eu quero que você analise com muita calma se vale a pena se abster do processo.

É claro que você deve ter motivos para não votar em Lula, mas queria que você pensasse no todo, e no que significou esse governo em relação a uma mazela histórica, a perversa distribuição de renda deste país.

No post anterior coloquei subsídios para julgamento. Nunca houve uma redução tão grande na miséria, e não foi só por causa do Bolsa Família. Estudo da Fundação Getúlio Vargas coloca, como outros fatores, o aumento do emprego e do salário mínimo, que subiu acima da inflação. A questão é simples: o pobre está comendo melhor, está podendo satisfazer as necessidades básicas. A oposição fala em "crescimento econômico medíocre", mas para quem realmente está precisando, o crescimento da renda é de 10, 12 por cento ao ano. Evitar que as pessoas passem fome não é uma grande realização? Você acha que um governo Ackmin faria isso?

Vejo entre os que vão votar nulo, pessoas de muito discernimento, que estão simplesmente cansadas da lama da política. Eu entendo isso. Mas são pessoas que não precisam tanto do governo para coisas básicas, mesmo numa situação de crise conseguem se virar. Já os mais pobres precisam, e muito, que o governo olhe por eles. O que eu peço a esses esclarecidos eleitores é um voto de solidariedade a nossos concidadãos mais pobres. Eles não têm canais pra se expressar, eles não têm computador para argumentar na internet, e por isso acabam sendo esquecidos no debate nacional. E para eles, as políticas sociais podem significar a diferença entre a vida e a morte de uma criança, entre o fracasso e o sucesso de um jovem.

A paulada que Lula e o PT pegaram já foi violenta, e não será a vitória que os deixará de salto alto de novo. Eles saberão ouvir as queixas e fazer um segundo governo melhor. Uma vitória de Ackmin significará a desorganização completa da esquerda e um fortalecimento dos reacionários como nunca se viu desde o fim da ditadura militar. Pense nisso.

por Marcus Pessoa, às 15:30 -

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