Velho do Farol

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9 de outubro de 2004

Futebol, paixão arrevezada

A propósito de dois posts iluminados de Adailton Persegonha no Leite de Pato, ambos falando de futebol, eu inauguro a fase preguiçosa desse blog colocando dois comments que estão lá, mas achei bons o suficiente para estar aqui também (reescritos un poquito).

Bem, eu nunca fui um bom jogador de futebol. Eu nunca soube jogar, nem de goleiro. Bem, de goleiro eu até fiz alguma coisa, mas sempre fui meio que uma negação. A bola parecia um amor não-correspondido. Eu sou, como o Persegonha, vascaíno (de pai, mãe e avós), mas não consigo me apaixonar tanto por time como ele, pois a minha paixão maior é aquele momento anárquico onde a bola parece que "escapou" da trajetória normal, sem querer, mas foi o artilheiro, ou armador, como que invisível-por-um-segundo, que permitiu essa falsa impressão, essa prestidigitação. Em resumo: eu sou um torcedor traíra, eu gosto de futebol bem jogado venha de onde for.

Fui obrigado, certa vez, a ir com um amigo para a torcida do Flamengo, num Vasco x Flamengo por volta de 1997 (ambos tínhamos ido ao Rio pra ver os sensacionais shows de Smashing Pumpkins e Cure no Hollywood Rock). Ele disse que não ia de jeito nenhum para a torcida do Vasco, e pra não brigarmos o acompanhei. Foi zero a zero, embora o Flamengo tenha jogado melhor e Romário tenha entrado três vezes na área sozinho. O problema (ou melhor, a solução) é que do outro lado estava Carlos Germano em grande fase. Bem, estou admitindo que sou um torcedor traíra, pois eu achei muito linda a devoção do pessoal rubro negro pelo time. Eu achei lindo cantarem músicas o tempo todo (o hino do clube inclusive, inteirinho), sem qualquer charanga de apoio. O Flamengo não se notabiliza por ter torcidas organizadas fortes, há que se notar.

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Mas digressiono. Quero apenas publicar dois comments que coloquei lá. No primeiro post, Persegonha faz uma ode sem reservas a Pelé, a propósito do documentário Pelé Eterno. E eu gostei...

"...muito de seu enfoque, principalmente porque você não fez como a maioria da cri-cri-crítica que só malhou o filme em si, esquecendo às vezes de chamar a atenção para o mito Pelé. Eu ainda não vi o filme, mas acredito piamente que, se ele for uma droga, mesmo assim as imagens do mito já valerão a pena, e muito.

Bem, eu vi um jogo do Barcelona onde Ronaldo, há uns anos atrás, parecia enganar os adversários só com a força do pensamento. Eu vi o momento exato em que Bebeto e Romário trocaram dados telepáticos pra fazer um lindo gol naquela pífia campanha de 94. Após o gol, as câmeras captaram a nítido cena (sem áudio) de Bebeto dizendo "eu te amo" para o colega. Coisinha fofa, não?

Cito esses momentos como uma comparação. Se hoje grandes jogadores brasileiros conseguem dominar os adversários só pelo fato de ter certeza de ser gênios, aparentemente nunca mais haverá gente a desafiar as leis da física como Pelé e Garrinha. Mas eu não fico tão triste com isso, só de ter essas imagens de arquivo já recebemos um pequeno sopro dos deuses".

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O segundo post foi sobre um jogo magnífico (que eu me lembro também, não com tantos detalhes) naquela fatídica Copa de 1982 (aquela onde o melhor time, disparado, caiu nas quartas). Zico, Falcão, Sócrates, Junior, Serginho, etc, deram olé na Argentina campeã do mundo e com Maradona. Acabei me lembrando de um jogo, pra mim, muito mais marcante, justamente a tragédia de alguns dias depois:

"Eu era muito novo nessa copa de 82, e foi a primeira que acompanhei inteirinha. Eu tinha a absoluta certeza que o Brasil ia ser campeão, e não consegui continuar a ver o jogo com a Itália depois do terceiro gol de Paolo Rossi. Parecia um pesadelo. Fui para o quarto angustiado, ouvindo a gritaria do pessoal e tentando rezar e pedir apenas que se fizesse justiça. No último minuto alguém jogou uma bola na trave da Itália, parece. Meu coração quase parou. Quando ouvi que não tinha sido gol, comecei a chorar. De verdade.

Perdi minha inocência nesse dia. A gente fica meio perdido quando, na única coisa importante no mundo em que nosso país é incontestavelmente o melhor, a sorte é tão traiçoeira, e os deuses tão caprichosos. Mas, enquanto você, eu e nós outros estivermos vivos, ninguém vai esquecer que aquele time foi um dos maiores times da história do futebol".

por Marcus Pessoa, às 03:22 -

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