17 de maio de 2006
Muita calma nessa hora
[atualizado] A essa altura ninguém tem dúvidas de que o governo paulista negociou com o PCC o fim dos ataques terroristas, né?Mas evitemos um moralismo indignado de ocasião. A revelação é chocante, mas, pensando no que realmente interessa, o bem-estar da população: o que teria sido pior, uma negociação com um grupo terrorista ou uma semana inteira de mortes, caos e desorganização na maior cidade do país?
Não me sinto em condições de crucificar o governo especificamente por essa decisão. Acho deplorável, sim, que eles mintam, falem grosso em público, "não negocio com bandido", e depois afinem entre quatro paredes. Também não tiro sua responsabilidade por não conseguir isolar os chefes da quadrilha de seus liderados. Mas, numa situação de clara inferioridade, foi uma decisão perfeitamente defensável.
Se o governador viesse a público dizer que negociou, sim, e que as concessões foram tão pequenas (TVs em áreas públicas dos presídios, troca da cor dos uniformes) que valeram a pena, teria o meu respeito. Infelizmente ele nunca fará isso, mesmo não tendo projeto político próprio. Prevalece entre a população o discurso dos vendilhões do ódio, que vê como única saída para a criminalidade o incremento da espiral de violência. A direita à qual se filia o PFL do governador Lembo, aliás, participa desse jogo.
O que também é deplorável é o revide que a polícia está dando, assassinando dezenas de suspeitos de envolvimento com o PCC. Infelizmente, essa ação criminosa da polícia (que assim se iguala aos bandidos que combate) receberá aprovação da população. Não adianta dizer que a polícia tem que agir dentro da lei. Não adianta mostrar as estatísticas de Caco Barcellos, de que dois terços dos mortos pela polícia não têm antecedentes criminais. Para a maioria das pessoas, o policial "sabe quem é bandido", e tem todo o direito de ser juiz, promotor e carrasco num processo que dura alguns segundos...
[update] A Olivia definiu bem as coisas: "tudo volta ao normal enquanto for isso que a gente costuma chamar de normal".
[update 2] O blog Nova Corja publicou um relato que permite inferir que o número de suspeitos do PCC que a polícia está matando é bem maior do que o divulgado oficialmente.
[update 3] O ministro Tarso Genro talvez quisesse superar o governador Cláudio Lembo em declarações infelizes, quando partidarizou a questão e responsabilizou Geraldo Alckmin pela onda de violência. Também disse que "o governo do senhor Alckmin (sic) parece que preferiu negociar com criminosos a aceitar a ajuda do governo".
Esse jogo de empurra é um ultraje à população que sofre com a falta de segurança. Por mais que o candidato do PSDB tenha feito ontem cobranças ao governo federal, o tom foi comedido. Caberia ao governo responder de forma institucional, explicando-se, em vez de se portar como se estivesse numa assembléia estudantil.
por Marcus Pessoa, às 02:16 -